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Psiquiatria Baseada em Evidências:
comentários: Ana C ChavesTratamento Farmacológico da Distimia
*Professor Adjunto do Departamento de Psiquiatria Universidade Federal de Pelotas, RS
Introdução
O termo Distimia refere-se a um transtorno afetivo de natureza crônica, caracterizado por sintomatologia depressiva, habitualmente não tão grave como na depressão maior. Essa condição foi definida na terceira edição do Manual Diagnóstico e Estatístico da Associação Psiquiátrica Americana (DSM-III, APA), em 1980. Persistem ainda dúvidas sobre sua natureza precisa e seus limites, já que apenas recentemente dados populacionais passaram a ser disponíveis.
Distimia tornou-se logo um termo popular nos Estados Unidos da América e outros países, como o Brasil. No entanto, psiquiatras europeus têm dificuldade em assimilar esse conceito. Se por um lado o grupo das depressões menores é muito heterogêneo, por outro a questão que surge é se a delimitação da distimia acarreta implicações terapêuticas ou simplesmente atende a interesses de mercado. Recentemente, um artigo escrito por um psiquiatra inglês defendia a utilidade do diagnóstico sindrômico síndrome neurótica geral, incluindo pacientes com sintomas ansiosos, depressivos e com características de personalidade dependente, situação comum em ambulatórios e serviços de atenção primária a saúde em geral (Tyrer, 1992).
Uma vantagem indiscutível, no entanto, foi obtida a partir da delimitação da distimia como categoria diagnóstica: muitos pacientes anteriormente tidos como portadores de perturbação caracterológica transtorno de caráter depressivo e habitualmente resistentes às abordagens psicoterapêuticas tradicionais passaram a ser abordados dentro do prisma das doenças afetivas. Em outras palavras, houve um aumento do interesse na abordagem farmacológica nesse grupo de pacientes. É preciso lembrar que, ainda distimia seja uma síndrome depressiva leve ou moderada, os sintomas são crônicos e a prevalência é maior na população geral do que as depressões graves ou psicóticas. Além do mais, estudos epidemiológicos como o ECA (Weissman, 1991) mostraram que a comorbidade também é elevada: mais de 2/3 dos pacientes apresentam também depressão maior, abuso de substância ou algum transtorno de ansiedade.
Há cerca de um ano foi iniciada um estudo sobre o tratamento farmacológico da distimia, com o objetivo de responder as seguintes questões:
Os dados que serão resumidos a seguir fazem parte de uma revisão sistemática sobre o tratamento da distimia, cujo protocolo está disponível na publicação eletrônica The Cochrane Library (Lima & Moncrieff, 1997). A revisão está ainda em andamento, e somente algumas das questões acima serão discutidas neste artigo.
Métodos e Resultados
Com o objetivo de evitar viés de publicação, foi realizada uma busca compreensiva de todos os ensaios clínicos randomizados nos quais qualquer psicofármaco fosse comparado com placebo no tratamento da distimia, através de consultas em várias bases de dados eletrônicas, checagem manual de referências e capítulo de livros, contatos com os autores dos principais estudos e com companhias farmacêuticas. Essa estratégia de pesquisa, descrita com detalhes a partir do volume 2 de 1997 da Cochrane Library gerou 5513 referências, cujos resumos foram checadas em busca de possíveis artigos relevantes. Foram localizados 15 ensaios clínicos que preencheram todos os critérios de inclusão e que apresentavam ao menos um dado que pudesse ser sumarizado juntamente com os demais estudos através de metanálise. Cinco autores forneceram informações adicionais e com isso maiores detalhes sobre a qualidade metodológica foram obtidos. No geral, a qualidade foi razoável. Uma análise de sensibilidade comparou os ensaios clínicos com escores mais altos em uma escala para avaliação de qualidade dos ensaios com os mais baixos, e não foram encontradas diferenças entre os dois grupos. Os principais resultados foram os seguintes:
Conclusões
Esta revisão está ainda em andamento, e o próximo passo é a análise dos ensaios clínicos que apresentam comparações diretas entre drogas ativas. No entanto, já é possível dizer que existe evidência científica para que possa se recomendar o tratamento farmacológico da distimia. Quinze estudos, todos randomizados e com razoável qualidade metodológica indicam que as abordagens medicamentosas são superiores ao placebo. Os resultados foram homogêneos, apesar de se referirem a diferentes estudos, em diferentes contextos e populações, o que aumenta o poder de extrapolação destes resultados. Considerando os resultados similares obtidos naqueles ensaios clínicos que estudaram pacientes com outros transtornos depressivos não maiores, não parece haver implicações terapêuticas no conceito de distimia como transtorno depressivo crônico, já que outros quadros depressivos leves e moderados, sem cronicidade, respondem igualmente bem à medicação. Ainda são necessárias maiores informações no que diz respeito a ensaios clínicos com longo período de acompanhamento, o que seria essencial dada a natureza crônica da distimia. Da mesma forma existe uma carência de dados sobre qualidade de vida. No entanto, a evidência disponível no momento envolve um bom número de pacientes, é de boa qualidade e indica que pacientes portadores de depressão crônica, durante muitos anos considerados resistentes as abordagens terapêuticas, podem se beneficiar com o uso de antidepressivos a curto prazo e a um custo relativamente baixo.
Comentários - Dra Ana C. Chaves
O artigo do Prof Maurício de Lima é muito interessante porque trata de assuntos controversos em psiquiatria: um é o próprio conceito de distimia e outro é o seu tratamento. O conceito de distimia, como bem disse o Prof Maurício de lima, é ainda controverso, mas já está bem assimilado nos Estados Unidos e também aqui no Brasil. Esquadrinhando a bibliografia utilizada na revisão pude observar que só foram incluidos estudos mais recentes, isto é, após o termo distimia já ter critérios operacionais descritos. Como o primeiro passo quando vamos procurar na literatura respostas para nosso atendimento clínico é checar se a população estudada é a mesma que a que estamos atendendo, é interessante incluir somente estudos que tenham selecionado a amostra a partir de um critério diagnóstico operacional.
Nestes últimos anos vimos a introdução de novos antidepressivos no mercado e junto com eles também sentimos a pressão da indústria farmacêutica para tratarmos deste tipo de transtorno. Através de uma excelente revisão sistemática da literatura de ensaios clínicos randomizados, publicada no " The Cochrane Library" por Lima & Moncrieff (1997), e estes autores concluíram que o tratamento farmacológico é superior ao placebo. Este dado é muito importante tanto para o psiquiatra como para o clínico geral que atende estes transtornos, pois a prescrição de medicaçãp nestes casos está realmente baseada em evidências.
Contudo, não houve diferenças entre drogas e entre diferentes classes de drogas. Isto é um resultado interessante pois além de aumentar as possibilidades de escolha de tratamento, também põe em xeque a hipótese de que existe um antidepressivo específico para tratar distimia.
Esperamos que a análise de comparações diretas entre as drogas ativas possam dar mais subsídios para a prescrição das medicações na nossa prática clínica.
ESTUDOS INCLUÍDOS NESTA REVISÃO
REFERÊNCIAS ADICIONAIS
Denise Razzouk e Giovanni Torello
Data da última modificação:23/08/00
http://www.priory.com/psych/distimia.htm